Seminário da Reposição Automotiva atrai público surpreendente e deixa uma grande dúvida no ar: é preciso criar um novo modelo de negócios para este mercado, mas qual?
por Cléa Martins e Patrícia Larsen (publicado originalmente no portal Mercado Automotivo, out/11)
Sabe aquela máxima de que não se mexe em time que está ganhando?
Esqueça. Nesta última edição do Seminário da Reposição Automotiva, que aconteceu no dia 13 de setembro, no Centro Cultural Fiesp – Federação das Indústriasdo Estado de São Paulo –, em São Paulo, os dirigentes das principais entidades e das empresas mais tradicionais deste setor jogaram por terra a famosa teoria popular.
Segundo eles, apesar do ótimo momento pelo qual passa o aftermarket brasileiro, é preciso que o mercado encontre novas formas de fazer negócios se quiser evitar a acomodação cada vez mais comum do seu setor.
“Evidentemente que somos bons no que fazemos e que ainda temos pontos a melhorar, mas vejo que ainda fazemos negócios como na época do meu pai, focados apenas no preço. Temos que ter mais conhecimento dos nossos clientes e das suas necessidades.
O negócio tem que ser feito na base do ganha-ganha, mas para isso temos que buscar um outro modelo de relacionamento e gestão”, afirmou Ana Paula Cassorla Mallusardi, diretora de Marketing e Compras da Pacaembu Autopeças.
Ana Paula foi uma das integrantes da mesa no painel Visão Estratégica da Reposição Automotiva no Brasil, discussão que reuniu, além dela e do mediador, Antonio Carlos Bento, vice-presidente do Sindipeças (Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores) e coordenador do GMA (Grupo de Manutenção Automotiva), executivos como Edson Brasil, vice-presidente da Delphi Soluções em Serviços para América do Sul, Alberto Ruffini, diretor de Aftermarket e Marketing da TRW para América do Sul, Douglas Lara, diretor de Mercado de Aftermarket da ZF do Brasil, José Carlos Di Sessa, diretor Comercial da Car Central, Rodrigo Carneiro, diretor Comercial da Distribuidora Automotiva, e Antonio Carlos de Paula, diretor e gerente-geral da Pellegrino Distribuidora de Autopeças.
A horizontalização de uma cadeia que, pelo menos teoricamente, sempre se orientou de forma vertical, respeitando a ordem de fornecimento fabricante, distribuidor, varejista, oficina e, por fim, consumidor final, foi o tema que trouxe à tona a necessidade que esses empresários sentem de mudança: “Esse é um momento de transição e provavelmente novos modelos de negócio surgirão. Nós todos estamos disputando mercado e vai sobreviver quem fizer a melhor leitura dos acontecimentos”, disse Ruffini, que admitiu: “O difícil é saber qual a escolha certa e por isso todos sofremos, ninguém quer errar”.
Para Rodrigo Carneiro o fato de se ter um mercado com preços em queda mesmo quando há falta de peças é sinal de que muita coisa precisa ser repensada: “Depois de tantos anos de trabalho, estamos mais fortes. Mas, ao repensar nossos negócios, talvez devêssemos partir de pontos de vista menos extrativistas para um mais associativista”, disse à plateia. Ainda segundo ele, o objetivo da cadeia como um todo deveria estar concentrado no dono do carro: “O consumidor final não conhece nosso produto. Fica frustrado quando tem que reparar o veículo e não pode gastar com outras coisas. Temos que chamar a atenção de todos os elos da cadeia mostrando onde investir – o mecânico em capacitação, o lojista em vendas, deixando o estoque para o distribuidor, afinal ele existe para isso, e, por fim, as fábricas deveriam investir em treinamento e programas de conscientização”.
Segundo Douglas Lara, as empresas do setor precisam investir na construção de valores que possam redefinir não apenas o setor, mas as práticas que o regem: “Lembro de já termos discutido em anos anteriores como enfrentaríamos uma ou outra crise ou problema, e desta vez os ventos sopram favoráveis. No entanto, isso por si só não vai nos levar ao sucesso.
Nosso desafio hoje não é mais o de conseguir entregar ou não uma determinada peça, lógico que pode existir lacunas, mas esse problema já foi superado. Nosso grande desafio hoje é o de como agregar valor ao nosso negócio. Não estamos conseguindo fazer isso com nossa estrutura. Por isso temos que parar e pensar: o que nos trouxe até aqui é o que vai nos levar adiante?”.
Para Edson Brasil, seja qual for esse novo modelo de negócios, é importante que se leve em conta a força da cadeia da reposição: “Somos responsáveis pela manutenção de cerca de 80% da frota de veículos em circulação no País. E isso não acontece no resto do mundo. Mas não podemos achar que isso vai se manter assim para sempre. Os concessionários estão fazendo o trabalho deles, enquanto nós estamos trabalhando para vender mais barato. Encontramos peças de fabricantes tradicionais com preços com diferenças de 30% entre elas, o que não cabe mais para o nosso mercado”.
Além de discutir a estruturação da cadeia, o grupo ainda debateu sobre a importância da capacitação profissional, o aumento de demanda, a capacidade de atendimento de novos e crescentes mercados, como o de motocicletas e de veículos importados, e o investimento constante das concessionárias no setor de reposição e serviços. “Temos um cenário positivo e de muitas oportunidades e são os desafios que permitem que a gente aprimore toda nossa competência.
A expansão conseguida pelos distribuidores ao longo dos últimos anos em todo o País é uma prova disso, ou alguém conhece algum outro segmento que apresente tamanha capacidade de logística?”, exemplificou José Carlos Di Sessa. Mas não foi só a necessidade de mudar velhos hábitos ou de se repensar os negócios da reposição que deram tom ao debate promovido no Seminário deste ano. O bom momento vivido pelo País e principalmente pelo setor de reposição não deve parar por aqui. “Se a gente fizer a coisa certa e trabalhar em gestão, temos tudo para continuar crescendo. O mercado está aquecido e deve continuar assim. Só no ano passado, faturou R$ 20 bilhões, isso sem considerar pneus, vidros e outros componentes”, finalizou Antonio Carlos de Paula.
Outras importantes questões
Enquanto um ditado parece ter caído por terra no Seminário deste ano, um outro se manteve firme – de que informação é a melhor ferramenta de trabalho. Não foi à toa que Raul Velloso, consultor econômico e colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo, foi convidado para participar do evento.
Sua palestra, Cenário Econômico Brasileiro: Perspectivas e oportunidades, mostrou aos presentes que o mundo está cada vez mais integrado e que não existem mercados, nem setores, totalmente alheios aos impactos econômicos mundiais. Além disso, Raul apresentou um comparativo bastante interessante sobre a atual conjuntura econômica brasileira e a de demais países. “Temos vivenciado uma época em que a indústria de transformação tem caído, enquanto os setores de serviços crescem. Tudo isso tem sido propiciado pelo nosso governo que é anti-investimento e pró-consumo, ao contrário do governo chinês, por exemplo”, afirmou.
Se o panorama passado por Velloso fez com que a plateia do evento entendesse melhor alguns reflexos da importação, também mostrou que é preciso cuidar do mercado interno. E a palestra de Alfredo Carlos Orphão Lobo, da diretoria de qualidade do Inmetro, mostrou que o setor tem agido nesse sentido.
O selo Inmetro de autopeças, que deve disciplinar a comercialização dos itens automotivos no Brasil, é uma das medidas mais aguardadas pelo setor no que diz respeito ao combate não apenas de itens piratas e falsificações, mas como empecilho da entrada no mercado nacional de produtos de péssima qualidade. “Para certificarmos uma peça usamos como base normas de qualidade já existentes no País, como as da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) ou no exterior, como as do tipo ISO. E, a partir da implantação do programa, que hoje está em período de adequação, podemos não apenas barrar a entrada de produtos não certificados no País como também apreender produtos sem selo de conformidade ou interditar e multar empresas que trabalhem com esses itens”, explicou Lobo.
Se de um lado a indústria tem investido na valorização de seus produtos, de outro, a certificação também parece ser a bola da vez no setor de serviços. Pelo menos é o que mostrou no evento Paulo Rech, especialista em desenvolvimento industrial do Senai. “Os veículos mudaram e os profissionais devem ser outros. Não é possível que existam mais mecânicos de ouvido, como se dizia antes. A eletrônica embarcada está cada vez mais presente nos novos carros e exige diagnósticos precisos. Lembra o mecânico do Fusca, que consertava o carro inteiro? Isso não existe mais, hoje temos técnicos especialistas em diferentes áreas. A certificação é uma maneira que teríamos de garantir ao consumidor um bom serviço”.
Ao defender a normatização do trabalho dos reparadores Rech apresentou o Sistema Senai de Certificação de Pessoas que, para o segmento, tem como referência a Norma ABNT 15681, que orienta sobre a qualificação do mecânico de manutenção de veículos rodoviários automotores. Antonio Fiola, presidente do Sindirepa-SP (Sindicato da Indústria de Reparação de Veículos e Acessórios do Estado de São Paulo), um dos grandes incentivadores da normatização da categoria, também se apresentou no evento. Segundo ele, os veículos evoluem ano a ano, o que complica os processos de manutenção. “Estamos num momento muito positivo de nossa história e, da mesma forma que me preocupo com alguns problemas, também me alegro em saber que temos nossas oficinas cheias, que as pessoas confiam na gente. Precisamos fazer isso valer, nos valorizar. Valorizar nossa mão de obra. Acredito que a certificação é um caminho”, diz Fiola. (N. do Blog: A Certificação do Profissional é fundamental, porém deve ser aliada à Certificação da Empresa, na qual o IQA oferece um reconhecimento do sistema de gestão da empresa, que é fundamental para o aproveitamento e resultados adequados dos profissionais envolvidos, com o máximo de benefícios para o consumidor final).
Em sua palestra o dirigente do Sindirepa-SP destacou ainda a importância do meio ambiente hoje dentro das oficinas. “Convivemos de perto com as exigências ambientais, como a do correto descarte de óleo lubrificante, e muitos de nós não perceberam ainda que, por outro lado, o meio ambiente é hoje um dos nossos grandes geradores de demanda. Precisamos saber usar isso a nosso favor e orientar nossos clientes sobre a importância da prevenção, seja ambiental ou de segurança”. (N. do Blog: Aqui também é importante ressaltar a possibilidade de reconhecimento de empresas de reparação automotiva que possuem um sistema de gestão ambiental através do IQA, apoiando-as no atendimento à legislação aplicada, o Selo Verde IQA-CESVI).
E por falar em prevenção, o engenheiro Olímpio Melo Álvares Jr., da Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental) explicou por que São Paulo e outros Estados e cidades no País ainda não implantaram seus programas de inspeções de veículos: “O Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), através da Resolução nº 418, determinou um prazo e a forma para a implantação da inspeção ambiental nos vários estados da federação, seguindo o que já ocorre nas cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro. Nós do Governo do Estado de São Paulo já estamos com tudo pronto e com o programa em fase de licitação há muito tempo. Não foi feito ainda porque esbarramos primeiro na resolução do Contran, de regulamentação dos itens de segurança, e depois na implantação da inspeção municipal de São Paulo”.
O evento
O Seminário da Manutenção Automotiva é considerado pelos representantes das principais entidades e empresas do setor o mais importante encontro anual do segmento. “Mais uma vez nos encontramos nesse evento que se consolida como o mais importante deste setor”, cumprimentou os presentes na abertura do evento Renato Gianinni, presidente da Andap (Associação Nacional dos Distribuidores de Autopeças) e do Sicap (Sindicato do Comércio Atacadista de Peças e Acessórios para Veículos de São Paulo).
Junto a ele, abriram a 17ª edição do Seminário, Elias Mufarej, diretor geral da Fiam para a América Latina e conselheiro administrativo do Sindipeças, Antonio Fiola, Antonio Carlos Bento, Álvaro Pereira, primeiro tesoureiro do Sincopeças-SP (Sindicato do Comércio Varejista de Peças e Acessórios para Veículos no Estado de São Paulo) e José Nogueira, diretor do IQA (Instituto da Qualidade Automotiva):
“Esse evento é um momento de reflexão e acho que essa platéia reflete o interesse e a preocupação crescente do nosso mercado com qualidade, de produtos ou serviços. E refletir sobre o aspecto da qualidade faz com que a gente não tema ninguém. Quem faz o Brasil somos nós”, afirmou Nogueira.
Realizado pelo GMA, que integra as principais entidades do setor – Sindipeças, Anda, Sicap, Sincopeças e Sindirepa –, o evento é organizado pelo Grupo Photon. Nesta edição, presidida por Elias Mufarej, o encontro reuniu cerca de 500 profissionais, entre representantes de todos os elos da cadeia de reposição e até de montadoras: “O mercado brasileiro está cada dia mais interessante e cabe a cada um de nós tornar nossos produtos e nossas empresas mais competitivos e atraentes ao consumidor.
As entidades que nos representam trabalham para isso; neste ano, por exemplo, o evento mostra os frutos de trabalhos que vêm sendo feitos e que devem beneficiar todo o setor, como os programas de certificação dos componentes pelo Inmetro e dos reparadores pelo Senai”.
Ao final do evento, dois iPads 2, oferecidos pela Car Central (Roles), foram sorteados ao público presente.
Acompanhe as novidades no site do evento: www.seminarioautomotivo.com.br
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